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Quando um velho conhecido descobre que um dos meus hobbys é LEGO, a habitual pergunta é “ainda brincas com legos?!”. Além do ponto de interrogação leva também com o de exclamação para melhor transmitir a ideia de admiração que normalmente a pergunta contém.
Ignorando o erro na expressão “legos”, não, não brinco com LEGO. A menos que se considere que um jogador amador de futebol esteja a brincar com a bola num qualquer jogo da terceira divisão regional (nem sei se isso existe).
Segundo o dicionário Priberam, brincar possui estes significados:
1. Divertir-se.
2. Entreter-se com alguma coisa infantil.
3. Galhofar; gracejar.
4. Agitar maquinalmente.
5. Proceder levianamente.
6. Fig. Agitar-se (diz-se das ondas).
Destes significados interessam para o caso os dois primeiros.
Divertir-me.
Sim, divirto-me quando construo um set ou um MOC(1), quando planeio uma nova construção original, quando vejo outros MOCs, quando participo em reuniões e encontros com outros AFOLs, quando escrevo e discuto sobre LEGO, quando estou a trabalhar em prol da Comunidade AFOL, etc. Mas alguma destas actividades transmite a ideia de brincar? Parece-me que não.
E “entreter-se com alguma coisa infantil”?
Sem dúvida que as peças LEGO são no seu âmago, um brinquedo. Bem, alguns conjuntos que a LEGO lançou nos últimos anos já não são bem brinquedos, tanto pelo seu elevado preço como pelo grau de complexidade construtiva. Mas pessoalmente já deixei de olhar para as peças LEGO como um simples brinquedo que teimo em não deixar mas mais como partes integrantes de um hobby. Mais ou menos como um jogador de futebol não olha para uma bola como um brinquedo.
Continuando a utilizar o mesmo exemplo. A bola pode ser um simples brinquedo mas a sua utilização e tudo o que envolve a sua utilização pode chegar a elevados graus de complexidade. Basta pensar no mundo do futebol e o no dinheiro que está envolvido para ter uma ideia do quão sério pode ser um… brinquedo.
Se um objecto simplesmente redondo pode provocar isso tudo, porque não as peças LEGO?
Exacto, as peças LEGO por si só já possuem um certo grau de complexidade, se adicionarmos tudo o que se passa à volta delas.. então ficaremos com um hobby rico de actividades intrincadas de tal maneira que já deixam de ser propriamente uma brincadeira.
O hobby LEGO é tão complexo, rico e dinâmico que pode tomar várias formas. Normalmente dividem a Comunidade de AFOLs em duas porções. Aqueles que coleccionam sets e aqueles que constroem MOCs. Claro que esta divisão não é completamente correcta e exclusiva visto que a maior parte dos AFOLs até fazem as duas coisas, mas para efeito de facilitar a explicação do hobby vou deixar assim.
Existem os AFOLs que coleccionam sets. Não incluo aqui a actividade redutora de comprar e acumular sets, isso qualquer pessoa pode fazer. Da mesma forma que coleccionar selos é diferente de acumular selos, coleccionar sets não se resume à compra e acumulação dos mesmos. Há todo um processo de classificação, estudo, pesquisa e busca que tornam a actividade extraordinariamente interessante. Lembro-me sempre do espanhol Rick83 e da sua pasta no BrickShelf e é também de recordar a exaustiva classificação dos primeiros sets LEGO por Gary Istok, como bons exemplos do que pode ser um coleccionador de sets LEGO. Só não me dedico mais a esta faceta do hobby porque teria que despender ainda mais dinheiro na concretização do hobby.
Mas esta faceta do hobby LEGO é exactamente aquela que se encontra no coleccionismo de outros brinquedos e outros objectos. Restringir o hobby LEGO ao coleccionismo é extremamente limitador do que o hobby pode realmente ser. O brinquedo LEGO já se distingue da maioria dos outros brinquedos pela sua capacidade de se transformar num “brinquedo novo todos os dias”(2), então o hobby também deverá explorar essa capacidade de transformação.
Podemos então começar a falar na construção de MOCs. A concepção de um MOC em LEGO é essencialmente a razão principal para me ter tornado AFOL. Ter uma ideia, passá-la para peças LEGO, jogar com as limitações e possibilidades das milhares de peças LEGO para conseguir compor o que pretendo sem no entanto recorrer a “batotas”, é uma das actividades de onde retiro mais prazer. É mesmo nessa actividade que o hobby mostra toda a sua riqueza, basta para isso navegar no BrickShelf e no The Brothers Brick (ou noutros sites sobre o assunto), para qualquer pessoa ficar maravilhada com o resultado daquilo que os AFOLs podem fazer com peças LEGO. São essas mesmas maravilhas que tornam o hobby LEGO único e especial.
Como em todas as actividades humanas, quando uma actividade começa a crescer, vão também prosperar outras acções paralelas que só tornam essa mesma actividade mais rica e dinâmica. Temos livros sobre técnicas de construção, temos reviews de sets, temos eventos e convenções, temos revistas, temos concursos, temos jogos, temos uma infinidade de possibilidades que tornam o hobby LEGO num dos mais dinâmicos que conheço. Para provar isso, basta fazer uma pesquisa de imagens no Google sobre um qualquer assunto (de preferência em inglês). No meio do resultados da pesquisa é normal aparecer uma qualquer construção LEGO.
Mas voltando ao significado de ser um AFOL, como é que uma pessoa sabe quando é um AFOL? Acho que quando o sentir. A própria constituição da sigla indica isso. Um Adult Fan Of LEGO é um fã, e um fã é no fundo, um admirador. E o acto de admirar é pessoal, portanto só o próprio é que o pode definir e avaliar.
Mas um admirador de quê, da empresa LEGO ou do brinquedo que ela fabrica? A ambiguidade desta sigla já levou a alguns adoptarem a designação de ALE (Adult LEGO Entusiastic). Como digo acima, coleccionar LEGO é uma faceta do hobby, mas o que torna este hobby único é mesmo a possibilidade de construir.. e isso é relativamente independente da empresa.
Quando me tornei AFOL era estudante, por isso o orçamento para o hobby era bem limitado. Todos os conjuntos que comprava (incluindo algumas raridades dos anos 80) eram invariavelmente abertos, montados e posteriormente divididos para peças. Todas as compras eram estudadas tendo em conta a maximização da utilidade das peças adquiridas. Agora tenho a sorte de ter um emprego, o que facilita a aquisição de peças e sets e que minimiza também o cuidado na escolha, podendo mesmo pensar em investir a longo prazo. Mas ter mais peças acumuladas em casa, faz de mim mais AFOL? Seria no mínimo estúpido calcular o meu amor ao hobby por uma característica externa ao mesmo, o dinheiro disponível para o hobby.
Por vezes sinto mesmo nostalgia de quando tinha poucas peças e tinha que construir um determinado MOC, com grandes limitações. O jogo de utilizar uma pequena variedade de peças era mesmo bastante desafiador. Como compreendo quando um novo AFOL chega ao hobby e sente-se extremamente limitado por falta de peças. Principalmente agora em que é inundado de bons MOCs por todos os lados, coisa que já não era tão vulgar quando comecei.
Claro que agora a facilidade de arranjar a maior parte das peças não torna a construção mais fácil.. mas sim diferente, com desafios diversos. Temos que conhecer mais peças e as formas em que elas interagem. Estamos atentos ao que se faz e das últimas correntes. Isso também torna o hobby interessante e enriquecedor.
A partilha de imagens de MOCs é outro dos pontos fortes deste hobby. Aliás, duvido que este hobby tivesse a projecção que tem se não fossem os AFOLs mostrarem o que constroem. Esta é provavelmente a maior publicidade que a própria LEGO pode ter.
Por isso ser AFOL também passa por mostrar o que se faz.
Por vezes pergunto-me porque gasto imenso tempo com actividades de divulgação deste hobby. Acho que é mesmo para dar a entender que ele não se limita a amontoar conjuntos/peças lá em casa. O interesse deste hobby vai muito além disso, basta saber procurar na Internet para nos maravilharmos!
LBaixinho
(1)por favor, se não estão familiarizados com algumas palavras e siglas, consultem a Wiki0937 (link).
(2)Havia um spot publicitário da LEGO que continha mais ou menos esta expressão.